1. Primeiramente, Denise, muito obrigado por dedicar seu tempo para essa entrevista. Poderia começar compartilhando conosco o que inicialmente a atraiu para o campo da psicanálise clínica e análise institucional?
Inicialmente a complexidade como nos relacionamos, criamos laços e inventamos enredos para nossa própria história, sempre me atraiu. Escutar sobre o sofrimento humano pode parecer difícil para alguns, mas para mim, sempre foi instigante. A forma e a criatividade que temos para nos motivar e também para nos enredar em mais problemas, me pareceu desde o princípio, motivos suficientes para o trabalho clínico.
É certo que quando estamos atolados e submersos às queixas e em adoecimento psíquico não percebemos de fato, qual é a nossa responsabilidade naquilo que nos queixamos, porém o tratamento clínico, em especial no campo da psicanálise (também na análise institucional), permite que o sujeito se perceba como agente ativo e também passivo, naquilo que reclama, no que padece e onde se coloca em relação ou submissão ao outro, em suas relações, sejam estas, afetivas, familiares ou profissionais.
Aquele, profissional e especialista que se proponha ao trabalho na área da saúde deve-se atentar não somente à sua técnica e especificidade, mas também aos efeitos sociais e culturais à qual o sujeito faz parte e está inserido.
Pois, assim como o psicanalista e psiquiatra francês Jacques Lacan, também acredito que “deve renunciar à prática da psicanálise todo analista que não conseguir alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua época” (LACAN, Jacques. “Função e campo da fala e da linguagem”. In Escritos, 1998, p. 321)
2. Sua experiência como Assistente Executiva em multinacionais certamente traz uma perspectiva única para seu trabalho. Como essa experiência influencia sua abordagem em psicanálise no ambiente de trabalho?
Primeiramente, minha perspectiva, atuação pregressa, somada agora à escuta analítica, desmistifica um pouco o papel e a onipotência de alguns líderes. Abre o discurso e traz para o jogo, novos pontos de vistas e novas perspectivas para um contexto que é muitas vezes blindado e hermético por uma cultura organizacional ou ainda que por ventura, por um estilo rígido de algumas lideranças.
Meu olhar múltiplo ou de alguém que já experienciou também contextos corporativos, é capaz de entender, supor, presumir ou perceber nuances inconscientes, o não dito das relações corporativas, a política e o corporativismo inserido na equação e para além disso, também perceber a tão vedada solidão sentida pelo líder.
Pode parecer fácil, mas liderar é olhar constantemente também para sua capacidade ou fragilidade de soltar as rédeas, delegar, confiar, direcionar, comunicar, repreender, mudar de planos e decidir. Tudo isso e mais um pouco, ao mesmo tempo e como se estivesse trocando um pneu com o carro em movimento.
Minha experiência profissional e clínica escutando líderes e C-levels, também me auxilia e é capaz de estabelecer, como o papel simbólico que o crachá e o cargo podem influenciar algumas pessoas.
Como estas são capazes ou incapazes de desejar e de se perceberem, para além de seu sobrenome, de um cargo executivo, do poder explícito e subliminar e de sua “marca corporativa”.
Em termos práticos e factuais, o crachá e o cargo são apenas uma falsa ou pseudo segurança, visto que esse vínculo pode ser facilmente interrompido por ambas as partes, inclusive.
No entanto, em termos simbólicos, devemos considerar que o trabalho exerce para o sujeito (e para alguns líderes, mais do que outros), um anteparo ou muro de contenção importante.
Ao mesmo tempo em que priva o protagonismo individual de brilhar em 100%, também compartilha a co-responsabilidade das escolhas quando estas são ruins. Estando em uma empresa e sendo porta voz desta, dividimos os ônus e bônus de ocupar este lugar.
Não é estranho também, o quanto, algumas pessoas dediquem boa parte de sua energia psíquica para atividades exclusivamente profissionais, quando negligenciam inconscientemente ou não, outras áreas de suas vidas.
O trabalho não raro, ocupa o lugar de sublimação, mas também, em muitos casos, é mecanismo de defesa para não se olhar para aquilo que incomoda.
Escutar sobre o adoecimento psíquico e relações conflituosas de um grupo de trabalho perpassa também à se “estudar” e analisar os afetos no funcionamento das relações para além do trabalho.
3. Você fala sobre a importância de promover o bem-estar psíquico e saúde mental em contextos corporativos. Poderia nos dar exemplos práticos de como isso pode ser implementado nas organizações?
Qualquer organismo que se predisponha a reunir pessoas em prol de um objetivo comum, deverá se valer de regras e direcionamentos próprios para que aquela estrutura e para que seus envolvidos caminhem na mesma direção. Para esse conjunto de valores ou credo, chamamos popularmente de cultura organizacional.
O que essa cultura não agregará ou abarcará de forma sistemática, racional ou tangível, serão todos os Não Ditos ou Códigos não verbais, que circulam naturalmente entre as relações e as pessoas. Ou seja, o conteúdo e o viés inconsciente que paira no ar entre as relações e pessoas não é capturado por um conjunto de regras ou signos.
Como somos seres da linguagem, isso significa que aquilo que digo não necessariamente será aquilo que o outro entenderá e que temos uma “lupa” e um sistema de códigos e um tradutor individual e distinto.
Isto torna necessário considerar que o óbvio precisa ser dito.
Como aquilo que é óbvio para a diretoria e o time de TI, não necessariamente é o óbvio para o time de marketing, por exemplo.
Dito isso e a partir das diferenças fundamentais que nos marcam, temos que interagir constantemente com o estranho do outro e assim sucessivamente.
É nesse sentido que afirmo que as pessoas não adoecem pelo trabalho que se propõem efetivamente fazer, mas sim, das relações e dos engodos, sejam estes fáceis ou difíceis, promovidos por esse organismo institucional, por essa cultura e por sua capacidade de permitir que esses não ditos tenham algum lugar de nomeação.
Ou quando como serão postos deliberadamente debaixo do tapete, como se “varridos” para não serem vistos, tão poucos ouvidos.
O papel aceita as regras.
Porém as pessoas diariamente vivenciam uma “Torre de Babel Inconsciente”, onde cada área ou cada líder pode dizer um idioma bastante distinto.
O viés inconsciente, a impossibilidade de nomeação, o que destoa do esperado jogado para debaixo do tapete, somados à realidade das altas cargas de trabalho, da falta de um limite simbólico estabelecido por esse sujeito que sofre, comunicação e bons acordos simbólicos entre líder e liderado, insegurança e fragilidade de uma posição, a pressão envolvida, a falta de tempo para elaboração dos afetos, e a inexistência de relações saudáveis para além do ambiente profissional, estes fatores quando encontram um ambiente ambíguo ou que não promova segurança e confidencialidade para olhar a pessoa como recurso humano, todas estas variáveis poderão sim, contribuir para adoecimento do sujeito (individual) ou ainda, o adoecimento da instituição (enquanto grupo ou time).
4. Em suas consultorias, como você aborda a mediação e a interlocução em situações de crise, especialmente em grupos executivos e diretivos?
Gosto de correlacionar sempre a responsabilidade da pessoa que precisa olhar para os fatores emocionais que já carrega em sua história de vida (pregressa ao trabalho), porém convidando e convocando as instituições a pensarem que seus ambientes podem sim, ser combustíveis tóxicos e inflamáveis que poderão estimular e muito, questões emocionais e psíquicas que se não olhadas, virão a tona, através de conflitos, turnover, absenteísmo, choques geracionais, número elevado de afastamentos por diagnósticos médicos e psiquiátricos, além de casos não notificados de forma explícita de depressão, síndrome de Burnout e até ideação suicida.
Parte do trabalho de interlocução é justamente o de fazer ponte entre as duas instâncias. Entre o individual e o institucional. Entre o sujeito e o coletivo.
Entre o um e o outro da empresa.
A consultoria propõe percorrer um percurso com a proposta de abertura e novas perspectivas para além daquilo que pode ser visto e ouvido superficialmente. Assim, como em um trabalho clínico individual, escutar o viés inconsciente de um grupo ou de uma organização é capturar aquilo que existe, porém, aquilo que é não dito ou que, não pode ser dito, mas que mesmo assim é sentido – entre as pessoas e na cultura -, sejam estes afetos como a insegurança e a brutalidade que um líder pode transmitir para sua equipe por exemplo.
A instabilidade e o medo gerado por metas agressivas e alta produtividade e a falta de direcionamentos claros e objetivos, também despontam como ingredientes que corroboram com o contexto.
Sabemos que ao mesmo tempo que existe uma cultura oficial implantada, há outra, extra oficial e invisível, porém igualmente potente e que também faz adoecer, pois por vezes desconsidera totalmente o sujeito e sua posição subjetiva nessas relações de trabalho.
Certa vez escutei de um líder. Saúde mental para quem?
Os líderes, também são muitas vezes negligenciados nessa equação.
E quando isso acontece, como podemos esperar que eles possam acolher, se também não são acolhidos como precisam.
Como não cobrar exaustivamente, se sobre mim, essa mesma cultura que diz acolher, exerce cobranças potencialmente exaustivas?
5. Sua próxima publicação, “Entre Coração, Mente e a Alma – Histórias de um Divã”, promete ser uma obra reveladora. O que os leitores podem esperar desse livro?
Fugindo de categorias, exemplos, regras, dicas ou formatos, me apoiando em meu testemunho singular de existência, mas também em notas ficcionais e retratos da minha prática clínica, procuro no livro descrever a importância da tessitura dos múltiplos laços sociais e do imaginário das nossas relações.
Como entusiasta dos benefícios e efeitos da psicanálise, enquanto psicoterapia, tenho a pretensão singela e ao mesmo tempo audaciosa de dialogar com o público leigo, sobre a importância da saúde mental e da psicoterapia como agente de tratamento do adoecimento psíquico contemporâneo.
Aos meus olhos e às pesquisas que desenvolvo, acredito que é grande o espectro da população brasileira que ainda considera que saúde mental é um cuidado restrito, único e exclusivo de quem padece de diagnósticos ou demandas psiquiátricas. Há ainda muito estigma e preconceito ao tema, sobretudo aos homens.
O livro tem como proposta, aproximar essa temática, podendo contribuir, desmistificar e esclarecer, sobre os aspectos da nossa complexidade, enquanto sujeito humano.
Para iniciar esse diálogo, devo considerar que iniciei o meu tratamento da mesma forma que muitos também começam.
Através de um luto. Ou melhor, através da perda física e simbólica de uma figura parental, que por muito tempo habitou meu imaginário, ocupando lugares ora de vítima e por vezes, algoz.
Ao contrário do que inicialmente podemos imaginar, quando procuramos a psicanálise em especial ou a terapia que seja, não necessariamente queremos nos livrar daquilo que nos faz sofrer.
Na verdade, queremos apenas aliviar o sofrimento e mesmo assim nos manter gozando dos benefícios simbólicos do nosso sintoma.
Não, não procuramos a cura. Queremos apenas “aliviar a pressão do sistema”.
A “cura” (entre muitas aspas) ou a mudança subjetiva será apenas uma consequência secundária, percebida apenas e só depois que estivermos prontos e dispostos a atravessar nossas fantasias e fantasmas inconscientes
Ou seja, o efeito ou benefício, seja lá, qual for, só será acurado, percebido ou sentido à posteriore. Só no depois, falo enquanto psicanalista.
6. Considerando o público-alvo diversificado que você atende, desde pequenas empresas até grandes corporações e instituições de ensino, como você personaliza suas palestras e consultorias para atender às suas necessidades específicas?
Costumo considerar aspectos subjetivos, desde, como é feito o primeiro contato, quem o fez, que demanda essa pessoa traz, qual a expectativa que a instituição almeja com esse trabalho e obviamente quem são as pessoas que serão impactadas.
Em um trabalho de saúde mental e bem estar psíquico não recomendo que a área de recursos humanos esteja exclusivamente ou como o único stakeholder dessa ação, por exemplo.
Naturalmente, o RH, assim como o restante da instituição, está inserido e imerso na problemática da qual eles demandam “correção” ou algum investimento de treinamento.
No entanto, se estiverem totalmente à frente dessa iniciativa, é o mesmo que comparar que a pessoa fizesse terapia com um primo. Ou seja, ambos estão influenciados e padecem dos mesmos comprometimentos psíquicos “causados” por uma mesma unidade familiar. Não há diante disso, a neutralidade que o trabalho exige.
Levo isso em consideração também ao personalizar e indicar o melhor tema ou percurso para cada instituição e empresa.
A verdade é que as empresas me contratam para entregar o que acham que querem e eu entrego, aquilo que percebo inconscientemente. Sempre devolvendo à elas, o que precisam, no modo de perguntas, novas reflexões e demarcando novos caminhos que possam estimular algum movimento e mudanças.
O percurso seja este de uma única palestra ou uma jornada de desenvolvimento, a mudança institucional é perene e gradativa.
E para isso preciso de autonomia e a chancela dos contratantes. O trabalho é feito em parceria e colaboração mútua.
7. Seu trabalho também aborda temas críticos como a violência escolar e a importância da escuta ativa. Qual a importância desses temas no desenvolvimento de ambientes educacionais seguros e inclusivos?
Todos nós, enquanto espécie, temos um potencial destrutivo de aniquilar o outro e aquilo que considero ser diferente de mim.
Mais do que nunca, encontramos socialmente falando, dificuldades simbólicas de conviver ou co-habitar com as diferenças.
Apesar dos debates sociais de inclusão terem sido cada vez mais inseridos desde de muito cedo aos jovens, ainda assim, padecemos da estranheza com o outro e do desejo íntimo de sermos aceitos e amados. Faz parte do âmago da nossa existência esse encontro e enlace com o outro.
Enquanto o discurso social de inclusão cresceu, o mesmo não será capaz de proporcionar ao sujeito, mecanismos de completude.
Por outro lado, a comparação com o outro (aquele que deveria me amar e me reconhecer como importante e especial) cresceu em tamanho.
Hoje somos influenciados por aspectos globais e multifacetados pelas redes sociais.
Enquanto antes dos anos 2000, a comparação que o jovem adolescente fazia era com o seu amigo da rua de trás, hoje, este se compara com pessoas e jovens do mundo inteiro. Desconsiderando que a rede social é apenas uma cortina ilusória e que a grama do vizinho não é tão verde quando se pensa.
Pelo excesso e pela alta demanda de atenção imposta, pelas múltiplas possibilidades que alienam, pela dificuldade de interação e limite com o outro, o sujeito adoece de sua condição de existir.
Tem adoecido psiquicamente com a impossibilidade de se haver com a escolha de um caminho e de uma alternativa em detrimento de renunciar a um mar de opções, igualmente sedutoras.
O sujeito jovem tem sofrido e tem trazido seu sofrimento ao corpo através de autolesões, na tentativa falha de um anteparo social ou de identificação e afetos, pois não tem encontrado em sua família. Igualmente esgotada.
Na falta de uma bússola simbólica de limite e de borda, o sujeito parece levitar, suscetível a responder lutas sociais, de gênero, de sexualidade e de políticas melhores, não somente por encontrar importância destas temáticas, mas também como auto anestesiamento de si. Para não olhar verdadeiramente para sua falta.
Nos perceber faltosos e castrados apesar de um retrogosto amargo que toda criança precisará lidar desde cedo, garante ao jovem adolescente e ao adulto, a construção de possibilidades de usar suas capacidades subjetivas para amenizar esse inevitável. É como receber da vida desde cedo, limões amargos e azedos.
Mesmo assim, apesar da inevitável acidez da realidade, é possível escolher entre deixá-los apodrecer ou criar disso uma limonada.
Alguns farão limonada suíça, outros farão mousse de limão, outros farão torta ou ainda caipirinha.
No entanto, a incapacidade simbólica de transformar o limão em outra coisa, tem trazido para alguns, o sofrimento psíquico. Sobretudo aos jovens.
8. Os depoimentos sobre seu trabalho destacam sua energia positiva e competência. Como você mantém essa positividade e motivação no seu dia a dia profissional?
Além do meu percurso de análise de quase duas décadas, além dessa escuta que tenho sobre os meus afetos, sobretudo como sou afetada pelas intempéries da vida e com o outro, bom, além disso tudo, prefiro acreditar que nada será para sempre.
E que o tempo presente, no hoje, sempre será de escolha e não o contrário.
Quando tudo que está vivo caminha invariavelmente para a morte e não estou ficando mais jovem com o passar dos anos, tenho uma relação íntima com a finitude.
Enquanto a morte pode ser um tema indigesto para alguns, prefiro pensar nesse tempo que tenho, do qual não sei, quanto tempo será exatamente, vislumbrando-o como uma oportunidade contínua de criar coisas novas, através do desejo que tenho pela vida e por tudo aquilo que me falta.
Não devo esquecer, que para mim, enquanto psicanalista, o desejo é inaugurado quando há consentimento que algo me falta.
Seja esse algo, um amor, dinheiro, trabalho, amigos e novos afetos.
Nesse sentido, como naturalmente sempre estarei de certa forma insatisfeita e nunca completa, o desejo vai se atualizando, trazendo pra mim, sempre novas perspectivas.
Isso não significa dizer que não há angústia, medo, raiva, insegurança, fragilidade ou falta de potência.
Pelo contrário, eu “só” analiso aquilo que sinto, escutando sobre esses afetos, nomeando-os e fazendo o que posso, dando destinos ao que posso criar com estes afetos.
Dá certo, sempre?
Lógico que não!
Para isso também acolho meus erros, respeito meu tempo, posso delimitar melhor as relações quando necessário.
Para que o desejo flua e circule criando o movimento necessário para a vida, preciso consentir que para cada escolha, haverá invariavelmente uma renúncia, pois não há como termos tudo!
Somos limitados por essência.
9. A promoção da saúde mental nas empresas é um dos seus principais benefícios e diferenciais. Como você convence as lideranças empresariais da importância desse investimento?
Principalmente apontando que o investimento é relativamente baixo e pequeno, se comparado com intercorrências mais complexas a longo prazo.
A cada um dólar investido, quatro retornam em forma de engajamento ou índices melhores de absenteísmo e turnover, por exemplo.
Considerando também os cenários mais amenos e menos complexos (em diagnósticos), o choque geracional entre os novos entrantes e os profissionais mais experientes também se mostram igualmente desafiadores.
Prevejo que algumas áreas ou especialidades sofrerão mais do que outras, mas sem exceção, a dificuldade de relacionamento já existe e convoca um número grande de empresas e líderes.
Por outro lado, empresas que optarem por ambientes homogêneos e sem multiplicidade perderão competitividade, ambientes ágeis e menos inovadores.
E mais uma vez, o aspecto de decisão permanece sendo o financeiro, além do ponto de vista mercadológico, dos conselhos administrativos, de posicionamento e marketing share.
10. Sua abordagem enfatiza a conexão emocional e seu impacto na lucratividade das empresas. Você poderia compartilhar um caso de sucesso onde essa conexão gerou resultados tangíveis para uma organização?
Primeiramente, o que proponho enquanto abordagem técnica é a consideração de que somos bem menos cartesianos do que gostaríamos e que as relações que estabelecemos com outro (seja este, outra pessoa ou ainda outro objeto enquanto empresa), dirá sobre nós e sobre nosso repertório e arcabouço psíquico.
A partir da psicanálise, o trabalho se propõe considerar como preceito algumas considerações básicas. Em primeiro lugar, somos sujeitos marcados pela linguagem e por desencontros naturais.
O que é óbvio para um, estará longe de ser óbvio para o outro. Porém, não vivemos em uma ilha, pelo contrário. Somos seres gregários e interdependentes entre si.
Através da linguagem, carregamos uma bagagem de expectativas, idealizações, fantasias e uma realidade que pode, – e normalmente – se apresenta bastante contrária com aquilo que pensamos controlar.
Principalmente no trabalho e nas interações em grupos. Pois é no trabalho que atuamos, vivemos através dos atos ou ainda que como autômatos e em automatismos ou caminhos que tem nos deixado robotizados. Já temos a partir dessa perspectiva inicial, bastante desafio.
Se não bastasse a linguagem, somos ainda divididos. Não estamos inteiros conscientes de nossas ações e escolhas.
Estamos muitas vezes reféns de afetos e de um inconsciente pouco decifrado.
Além disso, o que sentimos, os afetos que nos atravessam e nossas marcas não são esquecidas. São apenas reprimidas.
Isso significa afirmar, que sua relação com o trabalho também é direcionada, estimulada e intensificada por sua história pregressa e por afetos de um tempo longínquo.
Por fim, o fato de narrar, contar e recontar a sua história através de um percurso de análise, por exemplo, lhe garante “apenas” uma percepção, consciência e elaborações de alguns fatos de sua vida.
Isso, porém, não minimiza a importância que você precisará de uma Implicação, Escolhas, Ações e Mudanças em sua posição subjetiva nessa história.
Esse encontro propõe, trazer uma clareza e esclarecimentos da relação que temos com o trabalho que nos propomos fazer, para quem sabe, contribuir na construção de atuações melhores, sejam através de novas perspectivas, novos pontos de vista e ainda novas escolhas.
Para isso é importante que você conheça o que é subjetividade, seus afetos e seus primeiros vínculos, sua interdependência com o outro e além disso, como os sintomas sociais do nosso tempo intensificam essa complexa engrenagem.
Este é o nosso percurso. Esse é o nosso convite!
Citando apenas um exemplo, porém não tão raro no cenário das empresas brasileiras. Imagine uma empresa familiar que está atualmente experienciando a segunda geração de administradores. São quatro donos e dois CEOs. Duas diretrizes bastante distintas e uma comunicação que diverge em vários aspectos, inclusive estrategicamente. Para além das questões administrativas do negócio, poderá haver nessa dinâmica empresarial/familiar muito de um conteúdo velado de disputa, rixa, rivalidade e desavenças que não são ditas mas que influenciam diretamente e indiretamente todo o organismo daquela instituição formada.
11. A valorização do colaborador como pessoa integral é um pilar do seu trabalho. Como as empresas podem promover um ambiente que reconheça e valorize a individualidade de cada membro da equipe?
As doenças psiquiátricas, psicossomáticas e relacionais ao trabalho são a 3ª maior causa de afastamento e absenteísmo do trabalho. Cerca de 70% das demissões em níveis gerenciais estratégicos são por motivos comportamentais e relacionais. (Fonte: Great Place to Work)
Como lidar e avaliar essa realidade crescente?
Que tipo de mensagem elas querem nos passar?
Para um mundo que já não é mais o mesmo desde a pandemia, como podemos avaliar as técnicas da Psicanálise aplicadas ao trabalho, para suas relações, para o bem estar psíquico no dia a dia e para além dos consultórios de análise?
O número de afastamentos de transtornos mentais ligados ao trabalho aumentou 20 vezes nos últimos 15 anos. A página do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (Ministério da Saúde) traz um dado assustador no tópico “Transtornos Mentais Relacionados ao Trabalho”.
Entre 2007 e 2022 houveram 17.681 afastamentos por essa causa. Em 2007, o número foi de 119 afastamentos, enquanto em 2022 o número saltou 2.422 – um aumento significativo de nada menos que 20 vezes.
É preciso pensar no colaborador, para além de um contrato.
As pesquisas comprovam que investir na saúde mental das pessoas traz retorno financeiro.
É inevitável que as questões internas e emocionais, geram impacto na produtividade, na rotina de trabalho e, principalmente, nas relações. Olhar o colaborador como uma pessoa que sente, que pensa, que deseja e que anseia por esse espaço de fala, troca e partilha é um de nossos diferenciais.
Percebemos que além de trazer conhecimento durante as palestras e exposições de alguns temas, o vivido precisa ser ancorado para internalizar-se. Falar para nós, psicanalistas, é um caminho para a elaboração.
Por que não pensarmos em um caminho para a mudança institucional?
Mesmo que essa “cura” e mudança seja para uma empresa que tem sintomas e que deseja atualizar-se.
Neste sentido, a jornada propõe não apenas palestras, mas também encontros com os participantes, com a intenção de dar vazão às angústias que os impedem, muitas vezes, de terem boas relações de trabalho e comprometimento enquanto equipe diversa.
Sempre me perguntei! Sigo fazendo perguntas até hoje.
E quem quer saber, roga, sim, por certa mudança a partir do que se sabe.
Isso é da nossa natureza e não podemos questionar.
Hoje em dia, nos perguntamos e vamos perguntando aos outros também, coisas do privado, do íntimo, da reflexão.
O divã é meu dispositivo, sendo capaz de unir os estudos, os questionamentos, as pesquisas e o
movimento de mudanças ao qual a técnica e o tratamento se propõe.
Aprendemos a olhar, vislumbrar o ambiente ao nosso redor. E também nos questionar sobre
quais transformações seríamos capazes de promover.
Ficou fácil perceber que nossa sociedade roga por um novo olhar sobre a saúde mental, principalmente nas empresas
Percebemos, por ter já ocupado este lugar, que existe urgência para que as empresas falem a linguagem da próxima década e que olhem para a saúde mental com a mesma intensidade que o lugar que a diversidade ocupará.
Do meu lugar cabe falar sobre saúde mental. Mas e do seu lado, como olhar para isso?
Procuro entender de gente!
Gente de verdade. Pessoas que querem o melhor, mas que mesmo assim se sentem estranhas em muitos momentos. Estranhas ao novo, ao que vem, às mudanças que já acontecem e o que carecem de sentido.
Dar nome, tecer sentidos, conectá-los e estabelecê-los é o que pretendemos.
Promover um espaço para as emoções, acolher. E, sem dúvida, promover um olhar mais múltiplo, por que não, lucrativo e de troca.
(Continua na parte 2…)
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